Comitê de Enlace

Posição do Comitê Intercidades nas eleições de 2022

1 – Introdução

Nós do grupo Comitê Intercidades (CI), organizados para compor o Comitê de Enlace, expomos aqui a nossa posição nas eleições de 2022, em que, segundo apontam as pesquisas, se indica um provável retorno do PT ao poder executivo do Estado burguês, com baixas chances de continuidade do atual governo. Nesta conjuntura o CI defende o voto nulo. Para fundamentar tal posição, organizamos o presente texto com base em três principais linhas argumentativas. Recordamos, de início, o caráter burguês que o lulopetismo desempenhou nas últimas décadas. Criticamos, sem seguida, o suposto risco de fascismo do governo Bolsonaro, demonstrando a falta de sustentação desta tese amplamente difundida pela esquerda para justificar o apoio ao Lula no segundo turno. Tratamos ainda sobre a farsa da “reciclagem” do velho projeto político do PT e da figura de Lula, da lata do lixo da História, travestidos com a aparência de nova (ou “menos-pior”) alternativa política para a classe trabalhadora brasileira. E por último, tratamos do papel dos revolucionários nos processos eleitorais burgueses, afirmando a ausência de um necessário programa revolucionário dos principais atores das eleições.

2 – A verdade (ou o não esquecimento – Alétheia) sobre o PT

A inflação voltou a crescer a níveis alarmantes em todo o mundo. Vemos os preços dos alimentos, dos itens básicos para a sobrevivência dos trabalhadores e dos combustíveis subindo exponencialmente. Dia após dia milhares de trabalhadores são jogados no desemprego, muitos em uma situação de absoluta miséria. Nem mesmo a maior economia do planeta, os EUA, tem conseguido contornar os maiores índices de inflação já enfrentados nos últimos 40 anos. Mais uma vez a locomotiva da economia do planeta está em risco de descarrilar em uma provável crise catastrófica de superprodução e desvalorização do capital, sem precedentes na História. Possivelmente essa poderá ser maior que a crise de 1929. Se esse cenário se concretizar, a queda da economia norte-americana provocará um efeito em cadeia nas menores economias do globo[1].

Esse processo avassalador de destruição das forças produtivas é uma das manifestações da irracionalidade do capitalismo.  Já desde o século XX e nestas primeiras décadas do século XXI o capitalismo nos mostrou e mostra somente uma série de crises, guerras, epidemias, aumento da miséria e da fome, em uma palavra, o caminho da barbárie. Desde o final de 2019, antes mesmo da pandemia de COVID19 (que é apenas um catalisador e não a causa do ciclo de ruptura estrutural da produção capitalista)[2], a classe trabalhadora mundial sofre em mais um capítulo da crise periódica do capital, que se desdobra sempre em um processo de destruição e deterioração das condições da vida humana.

Esse novo capítulo da crise econômica é mais uma evidência de que o capitalismo não resolveu, não resolve e não resolverá nenhum dos problemas fundamentais da humanidade. Isso nos demonstra que, como sustentou Marx, em sua obra O Capital, as contradições do sistema capitalista são insolúveis, insustentáveis e catastró­ficas. Nessa atual crise – assim como em todos os anteriores ciclos periódicos – o fio condutor da teoria revolucionária de O Capital, de Marx, seguida por Lênin e Trotsky é reafirmada: o modo de produção capitalista é um sistema em agonia, sem possibilidade de ser reformado. É necessário superá-lo, revolucioná-lo.

Diante de um possível cenário em que avança e se consolida uma crise econômica mundial de grandes proporções, cabe urgentemente aos lutadores marxistas revolucionários recuperar as insuperáveis lições de Marx, Lênin e Trotsky sobre a necessidade de organizar a defesa e o combate da classe trabalhadora mundial contra o avanço da barbárie capitalista. Cabe, portanto, aos revolucionários marxistas a necessária tarefa de levantar, imediatamente, um programa político de defesa da classe trabalhadora mundial, um programa de combate ao desemprego e às reduções de salários[3]. Somente esse movimento da práxis revolucionária pode servir como alternativa à classe trabalhadora diante da destruição e irracionalidade capitalista. Somente a práxis de um programa revolucionário poderá reorganizar as forças produtivas do capitalismo em crise a partir das necessidades mais básicas dos trabalhadores: a garantia do emprego e do salário que garantam uma vida digna.

Trata-se, para nós do CI, daquele programa transitório embasado na análise de Marx e das experiências revolucionárias do século XX: o Programa de Transição da IV Internacional.

2.1. Dialética entre a crise do capital e a crise política da dominação burguesa e a história do PT, CUT e Lula

Em paralelo a esse histórico movimento de avanço e manifestação das crises econômicas periódicas capitalistas, segue, dialeticamente relacionado a ele, o histórico movimento de manifestação e avanço das crises políticas da dominação burguesa. No Brasil essa a crise política segue se aprofundando mais e mais. São escândalos atrás de escândalos que tomamos ciência (p. ex.: Mensalão; Petrolão, Laja Jato e tantos outros).

Por qual razão esses escândalos no interior do Estado burguês têm se revelado mais abertamente somente nas três últimas décadas?

Recordemos o declínio da ditadura no Brasil, orquestrada pela própria burguesia, que necessitava encontrar um plano para substituir a camarilha militar. A partir de 1978, foi colocado em prática um projeto que objetivava fundar um partido político que se apresentasse como o legítimo representante dos interesses da classe trabalhadora brasileira. Para canalizar a insatisfação social e as forças de luta da classe trabalhadora e da juventude, nascia o PT. Seu programa, no entanto, resumia-se a suposta promessa de reforma social dentro dos limites seguros da democracia burguesa, através da máquina e dos recursos do Estado capitalista. Ou seja, o oposto de um programa revolucionário socialista.

Após o fim da ditadura militar sucederam-se os governos de Sarney, Fernando Collor (que nem mesmo terminou o mandato, sendo substituído pelo vice, Itamar Franco) e Fernando Henrique Cardoso (que governou por dois mandatos seguidos). Nenhuma ação política desses governos burgueses conseguiu estancar significativamente o aumento do desemprego, o rebaixamento dos salários, o aumento da fome e da miséria. Não apresentaram qualquer perspectiva histórica para os trabalhadores e a juventude brasileira. Diante desses vergonhosos fracassos da direção burguesa, e do perigo de potencial levante massivo dos trabalhadores contra o capital, qual poderia ser a próxima alternativa para a manutenção da exploração capitalista?

Como nos ensinou Trotsky, em o Programa de Transição, “em tempo de guerra ou de revolução, quando a situação da burguesia se torna particularmente difícil, os dirigentes sindicais tornam-se, de ordinário, ministros burgueses.”[4]

O melhor para a burguesia era então tornar presidente um ex-operário, representante de burocracias sindicais, de grande popularidade na classe trabalhadora. Lula foi uma cartada da burguesia para conter a insatisfação e revolta da classe operária. Não havia, à época, e parece ainda não há, alguém melhor que Lula para desempenhar tal papel.

Vejamos com um pouco mais de detalhes o principal motivo pelo qual o PT, a CUT e Lula se tornaram a melhor alternativa disponível à burguesia. Desde o fim da ditadura militar até o início dos anos 2000.

Apesar de todos os fracassos sucessivos dos incompetentes governos burgueses, não houve no país nenhuma movimentação de massas, de uma oposição mais radical que representasse algum perigo para status quo do capital. Até mesmo o movimento que derrubou Fernando Collor, apesar de mobilizar as massas, esteve inteiramente sob o domínio do aparato da democracia burguesa. O que houve durante aqueles anos foi o aprofundamento da miséria, o rebaixamento dos salários, desemprego, exploração dos trabalhadores, a multiplicação a dívida pública e a submissão do país ao grande capital internacional.

Como pode ter acontecido esse agravamento na exploração dos trabalhadores sem um levante de massas? E ainda, sem a necessidade de um movimento de repressão aos trabalhadores e à juventude, tal como houve no período de governo dos militares?

A resposta está no ascenso do PT, da CUT e da figura de Lula. Ao longo das últimas décadas, desde a saída dos militares, eles bloquearam os movimentos das massas e, mais ainda, impediram o ascenso de um partido revolucionário. Essa natureza contrarrevolucionária do PT e CUT de Lula até hoje é um projeto político que se fundamenta nas bases sociais da própria burguesia. Basta lembrar que, ainda em sua gênese, o PT recebeu apoio declarado de alguns setores da própria ditadura militar, como “Golbery do Couto e Silva, o cérebro da ditadura militar, criador do Serviço Nacional de Informações. Os militares perceberam, muito cedo, nos sindicalistas do grupo de Lula, uma via eficaz de garantir a estabilidade burguesa após a retirada da ditadura militar”[5].

A burguesia percebeu que o fim do projeto de dominação pelo poder dos militares só poderia se dar, sem nenhum risco para continuidade da exploração capitalista, se fosse mediada pela criação de um novo movimento sindical distinto do chamado “trabalhismo” (de Brizola e do PTB – originário no getulismo). Esta nova burocracia deveria ter caráter nacionalista e, principalmente, teria que bloquear a possibilidade do desenvolvimento de organizações revolucionárias entre os trabalhadores.[6]

Além disso, para Benoit:

[…] esse projeto existente em setores militares se juntou ao projeto de toda uma intelectualidade universitária reformista, desde o início, integrada ao PT, e que o apoiou e o legitimou ideologicamente. Nesse sentido, é importante lembrar os intelectuais reunidos no (CEDEC) (Centro de Estudos de Cultura Contemporânea, dirigido inicialmente pelos sociólogos Francisco Weffort e José Álvaro Moisés).[7]

Esses setores burgueses não foram, contudo, os únicos a apoiar a criação e a consolidação do PT e CUT, de Lula. Naquela época também alguns grupos que se reivindicavam como de inspiração trotskista, desempenharam contraditoriamente papeis importantes nesse processo de bloqueio da construção de um partido revolucionário. Esses grupos compreenderam que o PT seria um caminho intermediário para a construção de um partido revolucionário. Benoit escreve que:

[…] cabe ressaltar a vacilação dos diversos agrupamentos de inspiração trotsquista: permaneceram eles, anos e anos, oscilando politicamente e com ilusões a respeito do PT. Lembremos: Convergência Socialista (seguidora de Nahuel Moreno, hoje, PSTU), Organização Socialista Internacionalista (seguidora de Pierre Lambert, hoje conhecida como “O Trabalho”), Democracia Socialista (seguidora de Pablo e Mandel), Causa Operária (seguidora de Altamira), todos eles, de uma forma ou de outra, não foram capazes de enfrentar o PT e elaborar um projeto da revolução brasileira, latino-americana e internacionalista. Todos eles recuaram nas tarefas fundamentais de construir a IV Internacional.[8]

Portanto, as respostas às inquietantes questões que levantamos anteriormente estão na própria história da gênese do projeto burguês de dominação do PT e da CUT. Estas são organizações de massa que, na prática, bloquearam paulatinamente as lutas potencialmente revolucionárias, desviando o potencial de rebelião da classe trabalhadora para a lutas burocráticas, sindicais e parlamentares. Tudo isso com apoio de setores militares, de intelectuais reformistas e até mesmo de grupos que se reivindicavam trotsquistas. Benoit analisa que foi seguindo esse caminho que:

[…] o PT, a CUT e os ditos trotsquistas tiveram grande sucesso: fortaleceram-se nas universidades, nos sindicatos, nos parlamentos, elegeram cada vez mais vereadores, prefeitos, deputados, governadores, até que, finalmente, em 2002, venceram as eleições presidenciais e chegaram ao governo federal.”[9]

E, afinal, qual foi a diferença entre os projetos políticos fracassados dos antecessores governos de Sarney, Collor, Itamar e FHC com o projeto político do PT, ao assumir o governo federal? Ao menos foram governos desenvolvimentista, tal qual projetaram Darcy Ribeiro e Celso Furtado nos anos 60?[10] Na prática, toda sua estrutura de dominação e exploração dos trabalhadores e da juventude brasileira foi preservada. Sobre isso, Benoit analisa que:

[…] somente o PT e a CUT podiam cumprir a continuidade dessa forma de dominação. Somente um governo semi-bonapartista, com características aparentes de frente-popular, podia permitir a continuidade dessa política econômica devastadora […] O PT, graças a sua ampla base social e sindical, era a única opção que permitiria a continuidade desse ciclo da dominação burguesa no Brasil. O grande capital financeiro sabia disso e, por isso mesmo, ainda que indiretamente, considerava o PT como o seu grande aliado, talvez até mais confiável do que o próprio PSDB de FHC.[11]

2.2. O PT e suas características bonapartistas

A partir de 2003 até 2009, durante os anos em que esteve à frente do governo federal, a burocracia petista-cutista coincidentemente se deparou com um ciclo econômico mundial de bonança capitalista, em que reinava certa estabilidade e crescimento da produção e circulação de mercadorias. Lembremos que estas fases de bonança econômica, no entanto, marcam intervalos entre os momentos de crise periódica do capital. E sob o governo do PT, aquela imensa quantidade de riqueza social disponível, principalmente na parcela abocanhada pelo Estado, na forma de recursos públicos, serviu como um bom hospedeiro para a casta política parasitária, que elevou às alturas os gastos públicos e os custos para garantir sua hegemonia na política nacional e a estabilidade do grande capital internacional.

Sobre esse período do governo federal sob o poder do PT, Benoit afirma que:

[…] essa burocracia petista se elevou quase como uma nova “classe”, com projetos e interesses próprios. Hoje se sabe que boa parte da cúpula petista dobrou ou triplicou em dois anos o seu patrimônio pessoal declarado em imposto de renda (é o caso de João Paulo Cunha, Sílvio Pereira, Delúbio Soares, Luiz Gushiken, Sereno e outros…) […] Esse governo semi-bonapartista de Lula, para se equilibrar no poder, chegou a aliar-se a certos setores dos mais corruptos dos partidos burgueses da direita (como PP, PL, PTB e hoje até o PRONA, partido de programa fascista). Da mesma maneira, na instância sindical, a CUT hoje se alia à Força Sindical e a outros setores totalmente corruptos dos sindicatos brasileiros.[12]

É importante compreendermos que essa busca pela salvação dos negócios capitalistas não é um processo homogêneo, alinhado ou conscientemente programático. Pelo contrário, ele é repleto de contrariedades, com múltiplas disputas entre diferentes setores da burguesia pelas fatias maiores na divisão dos recursos do Estado. Essa é a principal razão que faz com que a corrupção, mesmo sendo um fenômeno originário do modo de produção capitalista, se manifeste na esfera política de forma mais aberta (escancarada publicamente) nos momentos de crise econômica.

Dessa forma, com o uso dos recursos públicos do Estado, através das alianças corruptas entre os setores concorrentes, foi que se alcançou, pelo menos por alguns anos, um relativo e frágil equilíbrio entre o governo do PT com a heterogênea burguesia nacional. O custo pelo apoio das bases divergentes e corporativas (principalmente PMDB, PT, CUT, Força Sindical, PDT, MST, UNE, PSB, PC do B, PRONA, evangélicos, entre tantos outros) que sustentaram o PT no poder foi alto. Esse frágil equilíbrio não tardou em começar a ruir e já a partir de 2005 essa trama apresentou as primeiras fissuras, manifestadas publicamente nos sucessivos escândalos de corrupção.

Durante sua estada à frente do comando do Estado burguês, o PT assumiu características bonapartistas, aparentando estar acima dos interesses de classe, quando na verdade atendeu aos interesses da burguesia brasileira e do grande capital imperialista. Para cumprir esse papel de contenção da luta da classe trabalhadora, apoiou-se na população mais pobre, realizando programas assistenciais, como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida e o Prouni. Ainda que tenham proporcionado um certo alívio econômico mais imediato ao sofrimento dessa parcela mais empobrecida da classe trabalhadora, em nada alteraram a raiz dos problemas sociais, causados pela acumulação capitalista. Ou seja, representaram apenas migalhas e não ofereceram caminho para transformações duradouras. Não demorou para as crises econômicas neutralizarem até mesmo essas migalhas, provocando desemprego, arroxo salarial e exploração do trabalho.

Essa caracterização do PT, CUT e Lula como uma estratégia burguesa de tendência bonapartista para o bloqueio das forças revolucionárias no Brasil não é novidade. Essa análise já foi feita no passado por uma importante organização trotsquista, a Organização Socialista Internacionalista (OSI), antes de ser corrompida e dissolvida pelo próprio projeto petista. Vale a pena relembrar trecho de texto apresentado pela tendência “Oposição de Esquerda Revolucionária” no IV Congresso da OSI (Organização Socialista Internacionalista) em julho de 1980, que criticava os dirigentes da OSI por manobrarem a decisão de entrismo no PT (então em processo recente de fundação). O texto conta como a maioria das “organizações trotsquistas” no Brasil capitulou ao projeto do PT, impedindo a construção de um partido revolucionário, bem como relata sobre a caracterização do PT, a CUT e o Lula:

Em setembro de 1979, no Apêndice à Resolução de Julho, afirmávamos, a respeito do PT, a quem quisesse ouvir: Surgido no interior do sindicato oportunista, aglutinando velhos pelegos – inclusive com passado de interventor e policialesco – e pelegos mais novos, o PT vem mostrando a cada greve o seu verdadeiro papel: manter a estrutura sindical corporativista, quebrar o movimento grevista, participar, juntamente com Figueiredo, das tentativas de evitar a crise revolucionária. (A Luta de Classe, n.2, p. 27).

Por outro lado, a respeito de Luís Inácio da Silva – Lula -, aquele que posteriormente tornar-se-ia várias vezes capa do nosso jornal, ‘O Trabalho’, afirmávamos também em setembro de 1979: ‘Lula conchavou com o Ministro, foi coberto pela Igreja Católica, pelo PCB e iniciou a montagem de um aparato baseado no sindicato oficial, certamente inspirado nos bandos de gangsters que povoaram o sindicalismo peronista. (A Luta de Classe, N. 2, p. 27).

Em setembro de 1979, para nós da Organização Socialista Internacionalista, o Partido dos Trabalhadores e seu máximo dirigente – Lula -, sem que houvesse qualquer margem de hesitação ou dúvida, eram colocados como vinculados à classe dominante – a burguesia, aquela que no ano de 1978, para nós, derrubaria a camarilha militar. Não considerávamos relevante ou significativo, em setembro de 1979, a possibilidade que setores amplos de trabalhadores afluíssem ao PT. Para nós, naquela ocasião, não existiam dúvidas, o PT, qualquer que fosse a sua evolução, era uma articulação burguesa, um aliado do stalinismo, um pilar da ditadura: ‘A articulação do PT, independentemente se atrai ou não camadas mais ou menos amplas dos trabalhadores, é uma articulação burguesa, que joga, ao lado do PCB, um papel de apoio à ditadura no seu trabalho de impedir o desenvolvimento das greves e de evitar que o aparelho sindical corporativista seja quebrado pelos trabalhadores. [13]

O próximo trecho se refere propriamente ao momento do início da crítica do grupo Oposição de Esquerda Revolucionária à OSI pela contraditória aprovação da decisão de realizar o entrismo no PT, após passados poucos meses (entre setembro e novembro) entre a crítica da OSI ao projeto do PT e a virada circunstancial para o apoio e dissolução da OSI no interior do PT.

No entanto, se no Apêndice de setembro de 1979, o pilar da ditadura é o Partido dos Trabalhadores, em novembro do mesmo ano, o mesmo partido, a sua criação e articulação, passam a ser a caracterizadas por nós como algo que ‘corresponde às necessidades e às aspirações das massas e militantes’ (texto, intitulado ‘Comissão Brasil’, p.8). De setembro a novembro a conjuntura mudou, de setembro a novembro os fatos mudaram, de setembro a novembro o Partido dos Trabalhadores transformou-se radicalmente, de setembro a novembro o PT já não é mais o mesmo, de setembro a novembro o PT mudou? Ora, camaradas, de setembro a novembro, não mudou a conjuntura, não mudaram os fatos, o Partido dos Trabalhadores continuou o mesmo, nada mudou na articulação do PT, de setembro a novembro, mudamos nós, mudamos novamente nós! [14]

2.3. Ações traidoras do PT nas épocas em que esteve à frente do poder executivo

No final da década de 1970, movidos por levantes grevistas e pelo surgimento de comitês de fábrica, importantes, sérios e bem-intencionados camaradas participaram da fundação do PT. Não obstante, o partido surge como um conluio entre o sindicalismo semi-pelego, a esquerda católica e o militantismo pequeno burguês que buscavam uma fachada legal para eleger deputados.

Em um dos documentos da fundação do PT, a Carta de Princípios de 1º de maio de 1979[15], são colocadas, apesar de serem letra morta, questões como:

  • Participação em eleições subordinada ao objetivo de organizar a massa;
  • Autonomia face ao Estado capitalista; emancipação como obra dos próprios trabalhadores; células (núcleos) em todos os locais de trabalho;
  • Governo de trabalhadores baseado em conselhos;
  • Democracia direta exercida pelas massas;
  • Fim da exploração do homem pelo homem; operários vanguarda de toda a população explorada;
  • MDB como interesse dos patrões;
  • Democracia formal (entre 1945 e 1964) contrária aos trabalhadores;
  • Partido sem patrões;
  • Respeito ao direito de fração e de tendência;
  • Solidariedade às massas oprimidas do mundo.

A palavra greve é mencionada dez vezes no documento e a palavra patrões cinco vezes. Nesse sentido, pode-se classificar as ações do PT, desde o início, como “traição” aos princípios definidos na sua própria Carta de Princípios.

Até meados dos anos 90, pode-se ponderar que o partido mantinha uma certa independência de classe. Durante as eleições indiretas de 1985, expulsaram três deputados que votaram em Tancredo Neves contra Maluf. Seus constituintes se recusaram a assinar a Constituição de 1988 e a queimaram simbolicamente. Luiza Erundina foi retirada do partido por apoiar o governo burguês de Itamar Franco em 1993.

Porém, já era expressa sua degeneração com a expulsão de correntes revolucionárias, em 1992. Em 1996 o PT fez aliança burguesa com Garotinho, cria do latifundiário Brizola. Finalmente a grande pá de cal:  A adoção de um programa burguês, em 2002, quando definitivamente se consolidou como um partido de direita.

A CUT na década de 1990, por sua vez, dominada pela corrente majoritária Articulação Sindical, filiou-se à Confederação Internacional de Organizações Sindicais Livres (CIOSL), de orientação socialdemocrata. Sua postura era conciliadora e reformista. Exemplo foram as “negociações” entre os empresários, Estado e sindicatos nas Câmaras Setoriais, em que os interesses da burguesia venciam em detrimento ao dos trabalhadores.

Em 1997, durante o VI Congresso da CUT, por meio da adoção de um caderno de tese única da direção nacional, intensificou-se o caminho para a completa vinculação das ações sindicais aos interesses eleitorais/corporativos petistas e, consequentemente, para o controle do sindicalismo nos governos do PT que poderiam vir.

O Comitê Intercidades reconhece que o caráter abertamente burguês que caracteriza hoje o PT atingiu seu ápice no momento da ascensão do partido ao poder executivo do Estado capitalista. Essa consolidação do caráter burguês pode ser evidenciada ainda em 2002, quando foi lançada a Carta aos Brasileiros[16], escrita por Antônio Palocci e Roberto Marinho, formalizando a aliança com o capital através da indicação de um capitalista como candidato a vice-presidente, José Alencar, proprietário de uma das maiores empresas do setor têxtil do país. Consideramos que o programa capitalista expresso neste documento converteu o PT definitivamente em partido burguês de direita.

Ao assumir o ministério da fazenda do governo Lula, Henrique Meirelles, do BankBoston, foi, na prática, preposto dos bancos e manteve a política econômica neoliberal tucana, baseada no chamado tripé macroeconômico, que atrelou as ações econômicas aos interesses do mercado financeiro. A Petrobras foi entregue ao MDB e os Correios a Roberto Jefferson. Ministros do STF foram indicados sem nem mesmo consulta ao partido.

O governo Lula decepcionou, logo no primeiro mandato, os movimentos sociais que tinham alguma expectativa em relação à reforma agrária ou reformas urbanas. A demissão de Marcelo Resende do INCRA foi considerada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pelo MST uma “traição” do Ministério do Desenvolvimento Agrário, pois deixou claro a opção do PT por defender o latifúndio e a bancada ruralista e abandonar a tão sonhada reforma agrária. Dilma, em seu governo, escolheu a latifundiária Kátia Abreu como ministra da agricultura. O latifúndio se expandiu até a Amazônia, deixando vulnerável os povos indígenas e revelando a opção do PT pelas madeireiras, pecuária, monoculturas e mineradoras. 

As grandes obras das Olimpíadas 2016 e da Copa do Mundo 2014, que beneficiaram as empreiteiras e a especulação imobiliária, intensificaram os déficits habitacionais das cidades sedes, enquanto a falta de saneamento básico e o combate à especulação imobiliária foram ignorados.

Nos governos do PT, a educação se tornou um grande negócio para o capital que, por meio do PROUNI e do FIES, fez crescer um dos maiores grupos educacionais do mundo – a Kroton – que se beneficiou do dinheiro público às custas da formação precária e do endividamento dos estudantes. É importante recordar que esses programas são inspirados no Crédito Estudantil, criado na ditadura.

As parcerias público-privadas, regulamentadas em 2004, disfarçadas de “terceiro setor”, fizeram avançar o controle dos empresários sob a educação básica e o SUS, enriquecendo bancos e empresas com isenções e/ou imunidades tributárias (recursos públicos).

Lula também deu cabo de fazer a reforma social da previdência dos servidores públicos, favorecendo o mercado da previdência complementar, através dos fundos de pensão, enquanto a Dilma preparou as bases da recente reforma da previdência.

Assim, as reivindicações, mesmo que reformistas, ligadas aos movimentos sociais – terra e moradia – e as pautas vinculadas aos direitos sociais – saúde, educação e previdência – foram abandonadas (traídas) em prol do enriquecimento de latifundiários, empresários e banqueiros.

Mas é nas relações entre trabalho e capital e o controle dos sindicatos exercido pelo PT, através da CUT e toda burocracia sindical, que podemos apontar a sua maior traição. Graças ao poder que o petismo exerceu e ainda exerce sobre as organizações da classe trabalhadora e seus dirigentes que a crescente exploração do trabalho segue intocável. A diminuição do desemprego nos governos petistas se deu às custas da informalidade, da precarização do trabalho e das terceirizações.

Como demonstra os dados do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) a respeito das terceirizações no governo PT, a partir de 2003, comparado ao governo Fernando Henrique, o número de trabalhadores terceirizados saltou de 1,8 milhão durante o governo FHC para 12,7 milhões em 2013. Esses milhões de trabalhadores precarizados, cerca de 26,8% do mercado de trabalho formal, recebiam 24,7% a menos e trabalhavam três horas semanais a mais que os efetivos. Os dados ainda apontam que de cada 10 acidentes de trabalho, oito trabalhadores são terceirizados.[17]

O argumento petista é de que os governos do PT instauraram a terceirização restrita onde, por fim, quem tornou a terceirização irrestrita foi o decreto PL 4302, que permitiu a terceirização nas atividades básicas. Interpretamos de forma diferente. O PT no poder não apenas abriu caminho para a precarização do trabalho e ataque aos trabalhadores, como foi e ainda é um dos pilares e agentes fundamentais do ataque à classe trabalhadora em conjunto.

As migalhas dos programas Fome Zero e Bolsa Família serviram, na verdade, de sofismo para mascarar e sustentar a realidade da desigualdade social e da apropriação privada da riqueza capitalista. O efêmero crescimento econômico brasileiro durante a crise econômica mundial de 2008, resultado da estratégia de surfar na bolha especulativa internacional e da elevação dos preços das comodities, escondeu o grave processo de desindustrialização acentuado nos governos petistas.

Por fim, o PT demonstrou ser fiel aos interesses do capital, nacional e internacional, colocando seus administradores nos cargos mais importantes e estratégicos da política econômica brasileira, a exemplo de Joaquim Levy no Ministério da Fazenda. Demonstrou ser leal aos acordos e esquemas de corrupção, como mensalão e petrolão, enquanto ludibriava a classe trabalhadora com seus programas assistencialistas e seu discurso de pseudo-esquerda.

3. Fascismo de Bolsonaro e ameaça de golpe. Duas ideias falsas

Um dos argumentos mais comuns usados por aqueles que querem justificar o voto em Lula é que o governo Bolsonaro é fascista. Há quem chega a fazer a acusação de que quem não votar no PT coloca o povo nas mãos do fascismo. Acreditamos que há muitas ideias equivocadas sendo propagadas sobre esse assunto, resultando em erros nas práticas políticas.

A principal talvez seja a confusão entre discursos autoritários e fenômenos políticos com a capacidade de modificar a forma de Estado. Nossa sociedade de fato possui número considerável de indivíduos, organizações e empresas de comunicação que propagam ideias autoritárias e preconceituosas, como a exclusão de minorias e arbitrariedades policiais, entre outras. Diferentes termos são utilizados para adjetivar tais discursos, como “ultraconservadores”, “fascistas”, “direitistas”, “reacionários” etc. Independente da precisão analítica da aplicação destes adjetivos, é um erro confundir a existência destes discursos com o fascismo como fenômeno capaz de assumir a forma de um regime político.

Os líderes fascistas como Mussolini, Franco e Hitler ascenderam ao poder em partidos políticos pequeno-burgueses centralizados, organizados e militarizados de modo a destruir vanguarda dos trabalhadores pela força.[18] Diferentemente dos processos que geraram as outras formas de Estado burguês, foi um movimento de massas da pequena burguesia e do lumpenproletariado a favor da burguesia contra os trabalhadores, que impunha a unidade de pensamento, bem simbolizada pela fascio.[19] Já os regimes fascistas baseiam-se na autoridade de um líder autocrata, têm somente um partido, coíbem fortemente greves e a existência de sindicatos livres, censuram a sociedade e escolhem e perseguem seus inimigos.

Mesmo sendo uma força política inimiga da classe trabalhadora, o bolsonarismo (tanto como fenômeno social como forma de governo) não apresenta tais características e é pouco provável que possa vir a tê-las, como veremos nas linhas abaixo.

Durante boa parte de sua trajetória parlamentar, Bolsonaro não passava de mais uma figura pitoresca que povoa nossa política institucional. Entrou no parlamento federal como um saudosista da ditadura militar, um cultuador da violência individual e um nacionalista paranoico. De humor desrespeitoso, cheio de declarações preconceituosas e de ideias covardes, expressava profundo desprezo em relação aos mais vulneráveis. Durante quase três décadas, Bolsonaro foi eleito por partidos fisiológicos. Na câmara de deputados, sempre foi uma figura menor, pertencente ao “baixo clero”, como ele mesmo classifica sua posição. Foge ao escopo deste texto a análise dos motivos pelos quais essa figura grotesca não ganhou grande popularidade nem projeção política antes. O mais importante aqui é lembrar que durante boa parte de sua trajetória política Bolsonaro tinha seu pequeno curral eleitoral no Rio de Janeiro, mas não passava de pau-mandado no congresso, não mais que um peão no corrupto jogo político brasileiro. Nunca foi capaz de organizar um grupo político que atacasse organizações da classe trabalhadora, como se esperaria de um líder fascista, nem sequer obteve lugar de destaque nos muitos partidos que esteve filiado. Até 2016, não passava um “bufão”, de uma atração bizarra de programas de TV sensacionalistas.

Mas como ele conseguiu chegar ao poder? Recordemos que, desde 2010, o Brasil vivia o começo de uma fase de aumento vertiginoso e constante do número de greves, como registra o gráfico abaixo, que trabalha com os dados do DIEESE[20].

Embora as explicações para tal fenômeno sejam complexas demais para abordarmos com profundidade aqui, o fato é que, como mencionado acima, foi uma fase que o PT e a CUT perdiam domínio sobre sindicatos e as massas trabalhadoras. Em 2013 massas de trabalhadores mostravam-se cansadas da propaganda cínica sobre as benesses do crescimento econômico, mas sentiam o caos resultante do descaso de serviços públicos de transporte, saúde, educação, moradia etc. Atos na capital paulista contra aumento de passagem de ônibus resultaram em sublevações nacionais. Mesmo de forma não organizada, foram manifestações de público, independência e radialismo ímpares até então.

De 2013 a 2016 nenhuma resposta progressista veio do governo de Dilma. Ao contrário, houve maior repressão aos movimentos populares independentes e defesa intransigente de interesses capitalistas, como na época da Copa do Mundo de 2014. As mesmas políticas praticadas até então, com crescimento econômico baseado no incentivo ao crédito (leia-se, endividamento das famílias e pequenas empresas), financiamento dos “campeões nacionais” e baixo investimento em programas sociais. Cresce então a rejeição ao lulo-petismo e a mobilização da classe trabalhadora.

O período 2013-2015 foi também quando grupos e figuras menores pequeno-burgueses de oposição ganharam projeção, como, por exemplo, MBL, Vem Pra Rua, Moro e o próprio Bolsonaro. Setores pequeno-burgueses de “esquerda” atribuíram a ascensão destes grupos não aos resultados dos erros dos governos Dilma, mas como consequência das legítimas manifestações de 2013.  Neste momento, as pautas de esquerda foram capituladas por organizações liberais e corruptas como o Movimento Brasil Livre e o Vem Pra Rua.

A impossibilidade de manter o crescimento econômico fez com que Dilma Rousseff, no início do seu segundo governo, em 2014, tomasse medidas que atacaram diretamente os direitos dos trabalhadores, como corte de verbas em áreas sociais e a redução do seguro-desemprego, entre outros. Foi-se alastrando então um sentimento de extrema frustração quanto ao futuro e de descrença nas vias das políticas institucionais. Esse cenário resultou em elevado número de greves, atos de rua e crescente rejeição ao lulo-petismo. Tudo isso explica o impeachment de 2016. Por outro lado, parte da classe trabalhadora foi cooptada por propagandas reacionárias sobre a necessidade de ordem, segundo o qual a política institucional está cheia de corruptos (como de fato está) e o Estado, portanto, não é capaz de resolver nossas necessidades. Segundo este discurso, o que se tem a fazer é botar um militar no poder e salve-se quem puder com uma arma na cintura. Bolsonaro era o espantalho perfeito neste momento.

Ao mesmo tempo em que aparecia cada vez mais nas mídias, Bolsonaro foi sendo adjetivado por muitos de seus opositores, de forma abstrata, como fascista. Mesmo um pouco antes de chegar ao poder, alardeava-se inclusive a possibilidade de que os militares estivessem planejando um golpe.

Depois de um pouco mais de três anos e meio no poder, Bolsonaro fez um governo típico de qualquer gerente do Estado burguês, atendendo a interesses privados e atacando interesses da classe trabalhadora. Por diversas ocasiões, ele insinua a possibilidade de que os militares poderiam intervir na política e de que ele poderia chamar um levante para invadir o STJ e fechar o congresso. Ao enfrentar as consequências de seus atos, todavia, sempre recuou e se desmentiu. Bolsonaro jamais teve qualquer controle sobre os três poderes, nem mesmo sobre as forças armadas. Foi, inclusive, expulso do próprio partido pelo qual se elegeu. Brigou com diversos setores burgueses, como é o caso do governador de São Paulo, João Dória, representante do patronato paulista. Ou seja, estamos sob comando de um governo débil, com um líder medíocre incapaz de sequer ser bonapartista, que só consegue fazer propaganda que mobiliza seus apoiadores e amedronta sua oposição pequeno-burguesa. Toda capacidade de organização do bolsonarismo se resume a isso. Seu governo não é fascista.

Ao contrário do que a oposição pequeno-burguesa propaga, os capitalistas donos do Estado burguês não têm motivos para apoiar um golpe militar, pois eles já estão no poder, e estarão em 2023, seja lá quem for o eleito. Prova disso é que o processo eleitoral segue normalmente e o principal partido de oposição, o PT, está em plena campanha pela eleição de Lula. Banqueiros, empreiteiros e toda sorte de empresários e latifundiários corruptos financiarão as campanhas do PT, PL, PSDB, PDT, MDB etc. Mesmo no caso de uma eventual insurreição de militares e/ou policiais, coisa que não ocorreu desde que Bolsonaro assumiu a presidência, que setores burgueses sustentariam a presença de uma burocracia militar no poder? E para que fariam isso, já que interesses burgueses serão inteiramente satisfeitos, seja quem for o eleito?

Mas o medo do golpe militar ou de continuidade de um segundo governo “fascista” continua sendo propagado.  O que está por detrás desta chantagem?  Trata-se de uma ferramenta do lulo-petismo de amedrontar e desmobilizar a classe trabalhadora. Segundo esta narrativa mítica, a única maneira de derrotar o “fascismo” de Bolsonaro é a eleição de Lula. Sustentam, quase explicitamente, que se houver qualquer expressão de independência da classe trabalhadora, qualquer ataque ao nefasto lulo-petismo, haverá um golpe militar.

Aliás, seria a eleição de Lula a melhor maneira de combater este “iminente golpe”, ao invés do fortalecimento de movimentos grevista e até mesmo a formação de milicias populares? Obvio que não. Seria inclusive grande irresponsabilidade combater eleitoralmente uma tentativa de implantação de uma ditadura. A alta cúpula do PT sabe muito bem que não há ameaça nenhuma de golpe e que terão todo apoio da burguesia para governar. Esta falsa história é tão fantasiosa quanto a teoria bolsonarista que propaga que o PT estaria planejando um golpe comunista.

Em resumo, a teoria de eminência de um golpe militar não faz sentido, nem a da possibilidade de um novo governo fascista (pois nem o primeiro o foi).  Ao contrário da interpretação hegemônica da oposição, sustentamos que petismo e bolsonarismo são forças políticas interdependentes, consequência da crise do sistema representativo-burguês, que prejudicam a independência da classe trabalhadora.

4. A repetição do PT como alternativa (farsa) para a defesa dos interesses dos trabalhadores em 2022

A burguesia brasileira necessitou, e ainda necessita, de Lula. Não à toa é que ela o tem preservado, mesmo após inúmeros e sucessivos grandes escândalos, que já o levaram inclusive sua prisão. Lula foi salvo e blindado por acordões políticos que, também, livraram outras grandes figuras políticas.

Toda essa situação decadente da economia e da política, esses ciclos de crises econômicas e os escândalos de corrupção que vêm ocorrendo no Brasil e em outras partes da América Latina e mundo, representam a manifestação de contradições ligadas à falência dessa forma de dominação burguesa. Como bem nos ensinou Marx, em O Capital, os fenômenos da superestrutura não são mais que manifestações aparentes de fenômenos mais profundos, ocorridos nas instâncias da produção e circulação de mercadorias. Nos ciclos de crise econômica mundial, os capitalistas enfrentam enormes dificuldades de vender parte das mercadorias produzidas, o que impede a realização da sua taxa de lucro. Diante da possibilidade de falência, estes capitalistas buscam desesperadamente nos recursos públicos do Estado burguês a salvação para os seus negócios. O Estado brasileiro é, portanto, um balcão de negócios acessado somente por grupos capitalistas com instrumento particular de acumulação direta e privada[21].

No entanto, é justamente nesses momentos de crise econômica e da consequente intensificação da luta interna entre os setores concorrentes da burguesia que surge, também, o potencial momento dos trabalhadores se reorganizarem para defender seus empregos e seus salários. Diante desse perigoso potencial de organização dos trabalhadores, que se apresenta como um inimigo maior comum aos setores capitalistas em disputa, é que a burguesia necessita e se apoia mais uma vez em Lula.

A burguesia sempre temeu e ainda teme um possível movimento de avanço de massas, uma guerra civil, uma revolução. Por esse motivo aposta novamente na velha carta do PT, CUT e Lula, a fim de manter em pé uma forma específica de dominação burguesa que já dura várias décadas. Se por um lado, a burguesia demonstra sua incompetência em elaborar um novo projeto político de dominação, por outro a “esquerda socialista” não possui e não é capaz de elaborar um programa revolucionário para responder aos interesses da classe trabalhadora. A “esquerda socialista” permanece apenas reagindo às circunstâncias conjunturais com propostas indeterminadas.

Afinal, mesmo diante dessa crise de dominação burguesa e ainda do profundo e inquestionável desgaste do PT, da CUT e de Lula, seria ainda possível girar para trás a história? Seria possível, como se nada tivesse acontecido, manter de forma equilibrado o projeto de dominação burguesa, reerguendo para isso Lula, o PT e a CUT? Marx nos ensinou em seu 18 de Brumário, que

Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem por assim dizer duas vezes. E esqueceu de acrescentar: a primeira vez como tragédia, e a segunda como farsa.[22]

Após tantas traições aos interesses da classe trabalhadora e da juventude brasileira, agora em 2022 o provável retorno de Lula e do PT para centro do palco da encenação da democracia burguesa, desta vez aliado de forma mais aberta a um dos setores mais reacionários e atrasados da burguesia, à Opus Dei, representada pela figura autoritária e repressora de Geraldo Alckmin, não se configuraria como uma grande farsa para iludir, desviar e bloquear a força de luta revolucionária do proletariado?

5. Por que os revolucionários devem participar dos processos eleitorais burgueses?

Como já afirmamos, vivemos diante de uma das maiores crises do capitalismo. A necessidade de retomada da taxa de lucros é uma constante realidade internacional. A burguesia mantém seus pacotes de austeridades contra o proletariado e a velha saída para o enfrentamento de todos os males: as eleições.

A constante exploração da nossa classe vem acompanhada de capitulações, traições e abandono da perspectiva revolucionária diante da crise desse modo de produção. A burguesia busca jogar para o processo eleitoral dela toda a classe trabalhadora. Com esse movimento, se deslocam juntos as organizações reformistas e ainda muitas que se reivindicam revolucionárias. Todos juntos para eleger, supostamente, opção menos ruim. Esse posicionamento não deveria ser defendido pelos revolucionários, pois não contribui para avançar a classe trabalhadora na construção da revolução socialista.

Em 1920, o II Congresso da III Internacional, debateu sua posição sobre a relação entre o Partido Comunista e o parlamento. A resolução adotada foi escrita por Trotsky (A introdução), Lênin e Bukharin (As teses)[23]. Segue as teses sobre os comunistas e o parlamento:

II — COMUNISMO, LUTA PELA DITADURA DO PROLETARIADO E UTILIZAÇÃO DOS PARLAMENTOS BURGUESES.

1) O governo parlamentar tornou-se a forma “democrática” de dominação da burguesia que, em certo grau do seu desenvolvimento, necessita da ficção de uma representação popular. Aparecendo exteriormente como uma organização da “vontade do povo”, acima das classes, é, no entanto, um instrumento de coerção e de opressão nas mãos do Capital.

2) O parlamentarismo é uma forma determinada de Estado. Por isso não convém de forma nenhuma à sociedade comunista que não conhece nem classes, nem luta de classes, nem qualquer poder governamental.

3) o parlamentarismo não é também a forma do governo “proletário” no período de transição da ditadura da burguesia para a ditadura do proletariado. No momento mais agudo da luta de classes, quando esta se transforma em guerra civil, o proletariado deve, inevitavelmente, construir a sua própria organização governamental como uma organização de combate na qual os antigos representantes das classes dominantes não sejam admitidos; nesta fase, toda a ficção de vontade popular é prejudicial ao proletariado; esta não necessita da separação parlamentar dos poderes, que só lhe pode ser nefasta. A República dos Sovietes á a forma da ditadura do proletariado.

4) Os Parlamentos burgueses, que constituem uma das principais engrenagens do aparelho de Estado da burguesia, não podem ser conquistados pelo proletariado tal como o Estado burguês em geral. A tarefa do proletariado é a de fazer explodir o aparelho de Estado da burguesia, destruí-lo, incluindo as instituições parlamentares, quer as das repúblicas quer as das monarquias constitucionais.

5) O mesmo se passa com as instituições municipais da burguesia; e que é teoricamente falso opor aos órgãos de Estado. Na realidade, fazem também parte do aparelho governamental da burguesia e devem ser destruídas e substituídas pelos Sovietes locais de deputados operários.

6) O comunismo recusa-se a ver no parlamentarismo uma das formas da sociedade futura; recusa-se a ver nele a forma da ditadura de classe do proletariado; nega a possibilidade da conquista durável do parlamentarismo. Por consequência, não se pode pôr a questão da utilização das instituições do Estado burguês senão com o objetivo da sua destruição. É neste, e apenas neste sentido, que a questão deve ser encarada.

 7) Toda a luta de classes é uma luta política, pois ela é, no fim de contas, uma luta pelo poder. Qualquer greve que se estenda a todo o país torna-se uma ameaça para o Estado burguês e adquire, por isso mesmo, um caráter político. Esforçar-se por derrubar a burguesia e destruir o Estado burguês, é travar uma luta política. Criar um aparelho proletário de classe, seja qual for, com vista a governar e a reprimir a resistência da burguesia, é conquistar o poder político.

8) A luta política não se reduz, portanto, apenas à questão da atitude face ao parlamentarismo. Abarca toda a luta de classes do proletariado, desde que essa luta deixe de ser local e parcial e tenha como objetivo a derrubada do regime capitalista.

9) O método fundamental da luta do proletariado contra a burguesia, quer dizer, contra o seu poder de Estado, é, em primeiro lugar, o da ação de massas. Estas últimas são organizadas e dirigidas pelas organizações de massa do proletariado (sindicatos, partidos, Sovietes) sob a direção geral do Partido Comunista, solidamente unido, disciplinado e centralizado. A guerra civil é uma guerra. Nesta guerra, o proletariado deve ter um bom corpo político de oficiais e um Estado-maior político eficaz que dirija todas as operações em todos os domínios da ação.

10) A luta das massas constitui todo um sistema de ações em desenvolvimento contínuo que assume formas cada vez mais duras e conduzem, logicamente, à insurreição contra o Estado capitalista. Nesta luta de massas que se transformará em guerra civil, o partido dirigente do proletariado deve, regra geral, fortificar todas as posições legais, ter pontos de apoio secundários da sua ação revolucionária e subordiná-los ao plano da campanha principal, quer dizer, à luta de massas.

11) A tribuna do Parlamento burguês é um desses pontos de apoio secundários. Em nenhum dos casos se pode invocar contra a ação parlamentar o fato do Parlamento ser uma instituição do Estado burguês. Com efeito, o Partido Comunista não se encontra aí para desenvolver uma atividade orgânica, mas para ajudar as massas, do interior do Parlamento, a destruir pela sua ação independente o aparelho de Estado da burguesia e o próprio Parlamento. (Exemplos: a ação de Liebknecht na Alemanha, a dos bolcheviques na Duma czarista, na “Conferência Democrática” e no “Pré-Parlamento” de Kerensky, na Assembleia Constituinte, nas municipalidades, por último, a ação dos comunistas búlgaros).

12) Esta ação parlamentar que consiste, essencialmente, em utilizar a tribuna parlamentar para fazer a agitação revolucionária, para denunciar as manobras do adversário, para agrupar em torno de certas ideias as massas prisioneiras de ilusões democráticas e que, sobretudo nos países atrasados, voltam ainda os seus olhares para a tribuna parlamentar, esta ação deve estar totalmente subordinada aos objetivos e às tarefas da luta extraparlamentar das massas. A participação nas campanhas eleitorais e a propaganda revolucionária do cimo da tribuna parlamentar têm uma importância particular para a conquista política dos setores da classe operária que, como as massas trabalhadoras rurais, permaneceram até então, afastadas da vida política.

13) Os Comunistas se obtiverem a maioria nas municipalidades devem: a) dirigir uma oposição revolucionária contra o poder burguês; b) esforçar-se por ajudar, por todos os meios, as camadas mais pobres da população (medidas econômicas, criação ou tentativa da criação de uma milícia operária armada, etc. . . .); c) revelar em qualquer ocasião os obstáculos levantados pelo Estado burguês a todas as reformas radicais; d) desenvolver sobre esta base uma propaganda revolucionária enérgica sem temer o conflito com o poder burguês; e) substituir em certas circunstâncias as municipalidades por Sovietes de deputados operários. Toda a ação dos comunistas nas municipalidades deve integrar-se na sua atividade geral para a derrubada do Estado capitalista.

14) A campanha eleitoral deve ser conduzida, não no sentido da obtenção do máximo de mandatos parlamentares, mas no sentido da mobilização das massas debaixo das palavras de ordem da revolução proletária. A luta eleitoral não deve ser feita apenas pelos dirigentes do Partido; o conjunto dos seus membros deve tomar parte nela. Todo o movimento de massas deve ser utilizado (greves, manifestações, agitação no exército e na marinha etc.); estabelecer-se-á com este movimento um contato estreito. Todas as organizações proletárias de massa devem ser mobilizadas para um trabalho ativo.

15) Quando estas condições, assim como as contidas em instruções particulares são cumpridas, a atividade parlamentar está em completa oposição com a repugnante politiquice dos partidos social-democratas de todos os países, cujos deputados estão no Parlamento para apoiar esta “instituição democrática” ou, no melhor dos casos, para a “conquista”. O Partido Comunista só pode admitir a utilização exclusivamente revolucionária do parlamentarismo, tal como o fizeram Karl Liebknecht, Hoeglund e os bolcheviques.

16) O “anti-parlamentarismo” de princípio, concebido como a recusa absoluta e categórica em participar nas eleições e na ação parlamentar revolucionária, não é mais do que uma doutrina infantil e ingênua que não resiste à crítica. Resultando por vezes de uma sã aversão pelos politiqueiros parlamentares, não reconhece, por outro lado, a possibilidade do parlamentarismo revolucionário. Além disso, esta doutrina está muitas vezes ligada a uma concepção errada de Partido, que não é considerado a vanguarda operária organizada para a luta, de forma centralizada, mas como um sistema descentralizado de grupos mal ligados entre si.

17) Por outro lado, admitir por princípio a ação parlamentar revolucionária não implica de modo algum que se participe efetivamente em todos os casos nas eleições e em determinadas assembleias parlamentares. Isso depende de uma série de condições específicas. A saída dos comunistas do Parlamento pode ser necessária em determinados momentos. É o caso dos bolcheviques quando se retiraram do Pré-parlamento de Kerensky com a finalidade de o atacar, de o paralisar e de lhe opor brutalmente o Soviete de Petrogrado antes de tomar a direção da insurreição; quando decidiram dissolver a Constituinte, deslocando assim o centro de gravidade dos acontecimentos políticos para o III Congresso dos Sovietes. Outras vezes, impõe-se o boicote das eleições e o aniquilamento imediato pela força de todo o aparelho de Estado e da camarilha parlamentar burguesa; ou por vezes, a participação nas eleições combinada com o boicote do próprio Parlamento, etc.

18) Por consequência, reconhecendo a necessidade de participar, em regra geral nas eleições parlamentares e nas municipalidades, o Partido Comunista deve decidir a questão em cada caso concreto, tendo em conta as particularidades específicas da situação. O boicote das eleições e do Parlamento, assim como a saída do Parlamento, são sobretudo hipóteses admissíveis em condições que permitam a passagem imediata à luta armada para a conquista do poder.

19) É indispensável ter sempre em conta o caráter relativamente secundário desta questão. Residindo o centro de gravidade na luta extra-parlamentar pela conquista do poder político, conclui-se que a questão geral da ditadura do proletariado e da luta de massas por essa ditadura não pode ser posta no mesmo plano que a questão particular da utilização do parlamentarismo.

20) Eis, porque a Internacional Comunista afirma, de maneira categórica, que considera uma falta grave para com o movimento operário toda a cisão ou tentativa de cisão provocada no seio do Partido Comunista por esta questão e unicamente por esta questão. O Congresso apela para todos os partidários da luta de massas pela ditadura do proletariado, sob a direção de um partido centralizado influenciando todas as organizações de massa do proletariado, a realizar a unidade completa dos elementos comunistas, apesar das divergências quanto à utilização dos Parlamentos burgueses.

Os revolucionários devem participar das eleições burguesas com o único objetivo de desvelar, como afirmou Lênin, “a ficção dessa forma ‘democrática’ de dominação da burguesia que, em certo grau do seu desenvolvimento, necessita da ficção de uma representação popular.” Denunciar esse ilusório processo burocrático do Estado capitalista, que “aparecendo exteriormente como uma organização da ‘vontade do povo’, acima das classes, é, no entanto, um instrumento de coerção e de opressão nas mãos do Capital.” (cf. Tese 1 do II Congresso da III Internacional). Como ainda nos ensinou Lênin, na Tese 4, do mesmo Congresso, “Os Parlamentos burgueses, que constituem uma das principais engrenagens do aparelho de Estado da burguesia, não podem ser conquistados pelo proletariado tal como o Estado burguês em geral. A tarefa do proletariado é a de fazer explodir o aparelho de Estado da burguesia, destruí-lo […]”. E mais à frente na tese 6, Lênin afirma que “por consequência, não se pode pôr a questão da utilização das instituições do Estado burguês senão com o objetivo da sua destruição. É neste, e apenas neste sentido, que a questão deve ser encarada.” 

Nos processos de eleições parlamentares da democracia burguesa, os revolucionários devem aproveitar os espaços de debate, estabelecidos pela própria burguesia, para agitar para as massas do proletariado a bandeira de um programa revolucionário. Um programa que não é fundamentado em reivindicações mínimas, reformistas, nem tampouco em reivindicações máximas, utópicas. Um programa dialético que aparece, a princípio, como uma luta pela defesa da classe trabalhadora em suas necessidades mais imediatas, no combate ao desemprego e às reduções de salários, mas que não se reduz a elas, mas sim avança determinando-se gradualmente ao desvelar mais e mais as contradições do capital, rumo à organização das massas proletárias para a luta revolucionária. Vale ressaltar que o movimento revolucionário nos legou uma história e uma teoria, não receitas ou prontuários. À luz dessa história e teoria, nós que deveremos dar respostas para as tarefas do nosso tempo. Mesmo Lênin em seu tempo, de 1905 a 1920, jamais defendeu um posicionamento único todas as eleições. É preciso caracterizar a realidade concreta para termos uma política correta. Nem sempre acertamos. Como escreveu Marx em O 18 de Brumário:

… não podemos, mecanicamente, reproduzir o passado no presente sem dar vida à tragédia.[24]

5. 1. Defesa do voto nulo

Sobre esses argumentos apresentados acima, o Comitê Intercidades fundamenta a defesa do voto nulo já no primeiro e eventual segundo turnos dessas eleições de 2022. O atual cenário de crises econômicas e políticas, em paralelo ao exponencial aumento da exploração dos trabalhadores não nos permite admitir capitulações, traições e abandono da perspectiva revolucionária.

Mesmo os partidos que se reivindicam revolucionários, como o PSTU e o PCB, que possuem candidaturas próprias para disputar o primeiro turno das eleições 2022, têm atrás de si uma história manchada pela capitulação ao programa burguês do PT. Nos referimos em especial ao chamado pelo “voto crítico” nos candidatos do PT, que estes partidos defenderam no segundo turno das eleições de 2018. Essa tendência capitulacionista significa, na prática, o abandono das lições de Marx, Lênin e Trotsky, o esquecimento ou total abandono do programa revolucionário, o Programa de Transição. Isso significa submeter a classe trabalhadora a jogar o jogo da burguesia, transferindo a luta verdadeira das ruas e locais de trabalho para o palco ilusório do teatro da democracia burguesa, onde, na verdade, todos se aliam na defesa de um programa reformista. Uma aliança cujo objetivo, como já afirmamos anteriormente, é eleger, supostamente, o menos ruim. Esse posicionamento não deveria ser defendido pelos revolucionários, pois não contribui para avançar a classe operária na construção da revolução socialista. Muito pelo contrário, esse posicionamento bloqueia o desenvolvimento das forças revolucionárias, pois, ilude os trabalhadores com a esperança da possibilidade de reforma do capitalismo.

O CI considera que na conjuntura atual não existe no Brasil uma organização verdadeiramente revolucionária que esteja à altura do Partido Comunista da época de Lênin e Trotsky. Não há como mobilizar e organizar as massas do proletariado sem haver uma direção revolucionária. Não há como copiar na literalidade as lições de Lênin e Trotsky para orientar as ações de uma vanguarda revolucionária e de toda a militância revolucionária diante dessa atual situação de crise de direção revolucionária. Consideramos que o atual processo eleitoral burguês a luta política pode ser realizado em a defesa do voto nulo, cujo objetivo é trazer à pauta um debate programático fraterno entre inúmeros grupos e organizações que se reivindicam revolucionárias, com vistas a uma possível criação de um novo partido fundamentando na práxis de um programa único e revolucionário. O tempo atual é bastante oportuno para o Comitê de Enlace.

5.2. A tarefa dos revolucionários diante da farsa e da falência do regime de dominação burguesa

A tarefa dos marxistas revolucionários, diante dessa decadente farsa do PT, CUT e Lula, revividos dos mortos pelo desespero e pela incompetência da burguesia, é recuperar as clássicas lições sobre a necessidade de se levantar, imediatamente, um programa à altura dos interesses da classe trabalhadora mundial, contra o desemprego, contra a redução de salários e a carestia de vida. A tarefa dos marxistas revolucionários é reascender esse movimento concreto, práxis que pode nascer uma organização revolucionária internacionalista, que mostrará aos trabalhadores o caminho para derrotar o capitalismo.

Nós do CI nos referimos àquele programa transitório embasado na análise de Marx e das experiências revolucionárias do século XX:

Defesa dos salários: escala móvel de salários, ou seja, reajuste salarial mensal, de acordo com a subida dos preços dos produtos de primeira necessidade!
Defesa dos empregos: não a toda demissão e escala móvel de horas de trabalho, ou seja, divisão das horas existentes em cada fábrica e em cada local de trabalho pelos trabalhadores existentes!
Contra o desemprego: frentes públicas de trabalho já! Contra os sindicatos pelegos e contra toda repressão.
Formação de comitês: que devem ser independentes e formados por trabalhadores e estudantes em cada fábrica, empresa, escola e universidade.

Referências

BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. In revista Mais-valia ano I n. 1, novembro de 2007.

DIEESE. Balanço das greves. In: https://www.dieese.org.br/sitio/buscaDirigida?tipoBusca=tipo&valorBusca=balan%E7o+das+greves, acesso em 25 de junho de 2022.

MARX, Karl, O 18 de Brumário de Luís Bonaparte. Versão disponível em https://www.marxists.org/portugues/marx/1852/brumario/index.htm

OLIVEIRA, Carlinho Rodrigues de. Greves no Brasil, de 1978 a 2018: grandes ciclos, configurações diversas. In. Revista Ciências do Trabalho n. 15 DIEESE – ABET.

TROTSKY; LÊNIN; BUKHARIN. As teses do II Congresso da III Internacional, de 1920. In. https://www.marxists.org/portugues/tematica/1920/07/teses.htm.

_________. Revolução e Contrarrevolução na Alemanha. Disponível em https://www.academia.edu/38607542/Trotski_Revolu%C3%A7%C3%A3o_e_contrarevolu%C3%A7%C3%A3o_na_Alemanh%C3%A3

_________. O Programa de Transição. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/trotsky/1938/programa/cap01.htm#1

Núcleo de Educação Popular 13 de Maio. Crítica da Economia. várias edições. Disponível em:https://criticadaeconomia.com/2020/04/o-capital-em-coma-induzido/

Revista Mais-valia, março de 2008, ano II, n. 2.

Carta ao Povo Brasileiro, 2002. Disponível em https://pt.org.br/ha-16-anos-lula-lancava-a-carta-ao-povo-brasileiro/

Carta de Princípios, disponível em https://pt.org.br/wp-content/uploads/2014/03/cartadeprincipios.pdf

Terceirização e desenvolvimento: uma conta que não fecha: dossiê acerca do impacto da terceirização sobre os trabalhadores e propostas para garantir a igualdade de direitos. Secretaria Nacional de Relações de Trabalho e Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. – São Paulo: Central Única dos Trabalhadores. Disponível em 2014https://www.cut.org.br/system/uploads/ck/files/Dossie-Terceirizacao-e-Desenvolvimento.pdf


[1] Como apontam diversas análises do periódico on-line Crítica da Economia, do Núcleo de Educação Popular 13 de Maio, sobretudo os artigos publicados desde o final de 2019. Disponível em: https://criticadaeconomia.com/

[2] Cf. Núcleo de Educação Popular 13 de Maio, especialmente a edição de 13 de abril de 2020. Disponível em:https://criticadaeconomia.com/2020/04/o-capital-em-coma-induzido/

[3] O Programa de Transição, da IV Internacional, redigido por Trotsky, contempla justamente essas reivindicações, que não se esgotam em si mesmas (em seu aspecto meramente econômico e imediato), mas fazem vir à tona as contradições do capitalismo, abrindo brechas para um movimento dialético de avanço e organização da luta dos trabalhadores, tendo o geral (a revolução socialista) como pressuposto, parte do particular (reivindicações econômicas), determinando-se transitoriamente em direção ao universal (reivindicações políticas – a revolução socialista). Essas reivindicações transitórias do Programa de Transição são as chamadas escalas móveis: escala móvel de salários, ou seja, reajuste mensal de acordo com a subida dos preços dos produtos de primeira necessidade escala móvel de horas de trabalho, ou seja, divisão das horas existentes em cada fábrica e em cada local de trabalho pelos trabalhadores existentes!

[4] TROTSKY Leon, O Programa de Transição. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/trotsky/1938/programa/cap01.htm#1

[5] BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Mais-valia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 34 e 35.

[6] Cf. BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Maisvalia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 34.

[7] Em nota de rodapé a este trecho citado, Benoit esclarece informações interessantes e importantes sobre o CEDEC. Transcrevemos a nota na íntegra a seguir: “O CEDEC era uma versão petista do CEBRAP (o centro de FHC). Também no CEDEC se reuniam os quadros das chamadas “Ciências Humanas” brasileiras: sociólogos, antropólogos, economistas, historiadores (como Marco Aurélio Garcia) e uns poucos filósofos (como Marilena Chauí). Todos tinham algo em comum: eram teóricos pequeno-burgueses que, embasados no saber “científico” das “ciências humanas”, consideravam o leninismo como algo definitivamente superado. Na época, teorizava Marilena Chauí que “a riqueza do programa do PT era justamente a sua indeterminação”. Ali se desenvolveu a ideologia democratista do petismo: socialismo convivendo com formas de mercado, crítica a qualquer centralismo, o mito da cidadania, etc…” (Cf. BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Mais-valia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 35 nota sob n. 8).

[8] BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Maisvalia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 35.

[9] BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Maisvalia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 35 e 36.

[10] Conforme questões propostas por Benoit em BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Mais-valia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 35 nota sob n. 8. p 37.

[11] BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa”. in revista Maisvalia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 37.

[12] BENOIT, Hector. “A crise hoje no Brasil: o fim de um ciclo histórico da dominação burguesa in revista Maisvalia ano I n. 1, novembro de 2007. pp 37 e 38.

[13] Revista Mais-valia, março de 2008, ano II, n. 2 p. 85. É importante destacar que esse texto crítico da tendência Oposição de Esquerda Revolucionária, redigido para o IV Congresso da OSI, jamais foi admitido, circulado ou publicado, pela direção da OSI, que arbitrariamente tratou de soterrá-lo e esquecê-lo.

 

[15] Cf. documento publicado em https://pt.org.br/wp-content/uploads/2014/03/cartadeprincipios.pdf

[16] Cf. https://pt.org.br/ha-16-anos-lula-lancava-a-carta-ao-povo-brasileiro/

[17] Cf. aponta o documento Terceirização e desenvolvimento: uma conta que não fecha: dossiê acerca do impacto da terceirização sobre os trabalhadores e propostas para garantir a igualdade de direitos. Secretaria Nacional de Relações de Trabalho e Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. – São Paulo: Central Única dos Trabalhadores, 2014. Disponível em https://www.cut.org.br/system/uploads/ck/files/Dossie-Terceirizacao-e-Desenvolvimento.pdf

[18] TROTSKY, L. Revolução e Contrarrevolução na Alemanha. [S.l: s.n.], [S.d.].

[19] “Fascio”, em italiano, significa “feixe de varas”. O símbolo fascista consistia em uma machadinha envolta por um feixe. Em Roma, na Antiguidade, o lictor (uma espécie de oficial de justiça) levava uma machadinha envolta por um feixe de varas (em latim, “fesce”) nas mãos, quando ia executar as ordens judiciais. O feixe de varas significava fortalecimento com a unidade, com a união. As varas, unidas, ilustravam o povo italiano. A machadinha ilustrava o poder do “duce” (comandante) e a repressão. A mensagem era clara: ou os italianos se uniam e permaneciam fiéis a Mussolini, ou cabeças rolariam.

[20] Cf. OLIVEIRA, Carlinho Rodrigues de. Greves no Brasil, de 1978 a 2018: grandes ciclos, configurações diversas. In. Revista Ciências do Trabalho n. 15 DIEESE – ABET. Olibeira interpreta os dados do DIEESE. Balanço das greves. In: https://www.dieese.org.br/sitio/buscaDirigida?tipoBusca=tipo&valorBusca=balan%E7o+das+greves, acesso em 25 de junho de 2022.

[21] Veja, por exemplo as ações do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), que empresta grandes quantias de dinheiro público a empresas privadas sob juros baixíssimos. E ainda o exemplo das negociações dos títulos da dívida pública, que é realizada a partir da regulação da taxa Selic, taxa determinada pelo Banco Central. Como é esta taxa que regula a maior parte da dívida pública, o governo paga juros altíssimos aos bancos e fundos que detêm os títulos públicos.

[22] Karl Marx, O 18 de Brumário de Luís Bonaparte.

[23] Os camaradas podem acessar a Introdução de Trotsky e as teses aqui: https://www.marxists.org/portugues/tematica/1920/07/teses.htm.

[24] Karl Marx, O 18 de Brumário de Luís Bonaparte.